O Atleta de Esports como Atleta Profissional à Luz da Nova Lei Geral do Esporte

A nova Lei Geral do Esporte (LGE), instituída pela Lei nº 14.597/2023, promoveu importantes alterações no ordenamento jurídico desportivo brasileiro, especialmente ao redefinir o conceito de atleta profissional. Ao afastar a exigência de vínculo empregatício (Lei 9.615/98 – Lei Pelé) e adotar um conceito mais amplo, a legislação passou a reconhecer como profissional aquele que pratica esporte de alto nível de forma remunerada e permanente, tendo nessa atividade sua principal fonte de renda, independentemente da forma como recebe sua remuneração.

Esse novo enquadramento jurídico permite que modalidades não tradicionalmente reguladas pelo sistema desportivo clássico, como os esports, sejam analisadas sob a ótica da profissionalização. Assim, o presente artigo tem como objetivo demonstrar, com base exclusiva na LGE, como o atleta de esports pode ser considerado atleta profissional.

1. Esporte de Alto Nível e Esports

O primeiro requisito para o reconhecimento da profissionalização é a prática de esporte de alto nível. Embora a LGE não defina diretamente o que se entende por “alto nível”, o conceito pode ser extraído do art. 6º, III, que define esporte de alto rendimento como aquele com “treinamento especializado para alcançar e manter o desempenho máximo de atletas em competições nacionais e internacionais”.

No contexto dos esports, é notório que os atletas de ponta participam de torneios altamente competitivos, que exigem rotinas intensas de treinamento, preparação técnica, acompanhamento psicológico e físico, além de estrutura profissionalizada. Trata-se de uma atividade que, a exemplo das modalidades esportivas tradicionais, demanda alto grau de especialização, disciplina e comprometimento com o desempenho máximo em competições organizadas por ligas nacionais e internacionais.

Sendo assim, é razoável concluir que, ao preencher os critérios do esporte de alto rendimento, o atleta de esports se enquadra na definição de praticante de esporte de alto nível.

2. Dedicação Permanente

O segundo critério estabelecido pela LGE é a dedicação permanente à prática esportiva. Trata-se da exigência de envolvimento contínuo, não esporádico, com a modalidade praticada, de forma que o desempenho do atleta seja sustentado ao longo do tempo e compatível com o nível de exigência das competições de alto rendimento.

Atletas de esports profissionais mantêm agendas constantes de treinos, jogos oficiais, participação em bootcamps e compromissos com patrocinadores. Essa dedicação vai além de um hobby ou atividade recreativa: configura um investimento sistemático e prolongado na carreira esportiva, sem o qual seria inviável manter-se competitivo no cenário profissional.

Ainda que essa dedicação não ocorra sob um contrato de trabalho formal com organizações esportivas, ela se apresenta como elemento suficiente para caracterizar a permanência exigida pela LGE, já que o vínculo empregatício não é requisito essencial para o reconhecimento da profissionalização.

3. Remuneração como Fonte Principal de Renda

Por fim, a LGE exige que o atleta retire da prática esportiva sua principal fonte de renda, ainda que a contraprestação não seja obtida por meio de um contrato de trabalho. O art. 86, §9º, da nova lei, expressamente admite diversas formas de remuneração, como bolsas, patrocínios, premiações e exploração da imagem, sem que isso gere vínculo empregatício.

No cenário dos esports, atletas frequentemente recebem remuneração de múltiplas fontes: salaries pagos por organizações, premiações por desempenho em campeonatos, valores advindos de patrocínios e monetização de suas plataformas digitais. Ainda que algumas dessas fontes sejam eventuais, o conjunto de receitas decorrentes da atividade esportiva compõe a principal fonte de renda desses atletas, cumprindo, portanto, o requisito legal.

A LGE esclarece que as relações esportivas são pautadas na liberdade de contratação, e que a contraprestação financeira por si só não possui o condão de qualificar vínculo empregatício. Assim, ainda que o atleta de esports receba valores de organização esportiva, esse elemento isolado não implica, necessariamente, a existência de relação laboral, desde que respeitados os contornos legais da contratação cível.

Conclusão

A nova Lei Geral do Esporte adota um conceito funcional e abrangente de atleta profissional, desatrelado da formalidade do contrato de trabalho e atento à realidade contemporânea das diversas práticas esportivas. O enquadramento do atleta de esports como profissional se sustenta nos três pilares definidos pela legislação: (i) prática de esporte de alto nível, (ii) dedicação permanente e (iii) percepção de remuneração como principal fonte de renda.

Nesse sentido, os esports não apenas se inserem na lógica jurídica do esporte profissional, como também revelam a adequação e atualidade da nova legislação ao contemplar, com coerência e flexibilidade, as transformações do universo esportivo contemporâneo.

Hudson Paiva Jr.

Advogado especialista em negócios no esporte e Direito Esportivo pelo CEDIN, membro do IBDD e da Comissão de Direito Desportivo da OAB/MG e pesquisador da SBDD.

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